O Supremo Tribunal Federal (STF) vai decidir, em julgamento com repercussão geral, se marketplaces e empresas que intermedeiam pagamentos podem ser responsabilizados pelo recolhimento do ICMS em vendas realizadas por terceiros, nos casos em que o vendedor não emite nota fiscal ou descumpre obrigações legais. De acordo com a Secretaria de Fazenda do Rio de Janeiro, a medida pode gerar até R$ 5 bilhões adicionais por ano aos cofres do Estado. Apesar do potencial positivo de reforçar a arrecadação para cada estado, a proposta é vista com cautela, pois pode impor custos elevados às plataformas digitais, transferindo a elas riscos que originariamente caberia aos vendedores, além de abrir espaço para que cada estado estabeleça regras próprias, criando insegurança jurídica e dificultando a atuação das empresas em âmbito nacional.
A ausência de fundamento na legislação atual para atribuir essa responsabilidade demonstra que os Estados, ainda que sob justo pretexto, vêm transferindo sua incumbência fiscalizatória aos contribuintes. Isso impacta diretamente os custos de conformidade das plataformas, sobretudo porque muitas operam em nível nacional ou até global. “O assunto tem sido tratado de forma simplista sob o viés regulatório, com evidente transferência de ônus fiscalizatório às plataformas de marketplace que, em muitos casos, sequer são contribuintes do ICMS”, afirma Felipe Wagner de Lima Dias é sócio responsável pela área tributária do escritório Marcos Martins Advogados
Segundo o especialista, é preciso prestar atenção nos três principais possíveis impactos deste movimento:
- Desafios jurídicos e de compliance – O STF precisa endereçar se a legislação estadual tem base para responsabilizar marketplaces. Caso avance nessa linha, seria necessária uma norma nacional uniforme para evitar insegurança jurídica e custos desproporcionais. Alternativamente, poderiam ser exigidos padrões mínimos de compliance, como já ocorre em outras situações de fiscalização tributária.
- Impactos nos modelos de negócio e na competitividade – Embora a decisão não deva redesenhar toda a economia do e-commerce, pode elevar custos e tarifas cobradas pelas plataformas, que precisam investir em mecanismos de controle e endurecer regras de cadastro e uso. Isso pode reduzir o acesso de pequenos e médios vendedores ao ambiente digital, sobretudo em operações menos estruturadas.
- Custo da conformidade e agilidade do setor – Caso haja responsabilização, a conciliação entre arrecadação e eficiência deverá vir da automação e de soluções tecnológicas. Plataformas podem investir em sistemas de inteligência artificial e integração de dados fiscais para monitorar notas, validar cadastros e reduzir riscos de responsabilização. Sem esse suporte tecnológico, há risco de maior burocracia e perda da flexibilidade que caracteriza o e-commerce.
A decisão do STF poderá ser um marco para a regulação do comércio eletrônico no Brasil. Se, por um lado, pode trazer maior segurança jurídica e uniformidade, por outro, levanta preocupações sobre aumento de custos, barreiras de acesso para vendedores e maior complexidade operacional para marketplaces.
“O papel do marketplace sempre foi aproximar vendedores e compradores em ambiente digital. Ainda que esses modelos tenham evoluído para oferecer serviços como frete, meios de pagamento e até ferramentas fiscais, isso não os torna corresponsáveis pelos tributos de terceiros, assim como um shopping não responde pelos impostos de seus lojistas”, opina Dias.