No competitivo universo do e-commerce brasileiro, o frete grátis deixou de ser apenas uma vantagem promocional e se tornou um elemento central na psicologia do consumo. Mais do que diferencial, virou expectativa, capaz de definir o sucesso ou o fracasso de uma venda. Mas qual é, de fato, o peso desse fator na decisão final do cliente? E como as marcas podem aplicá-lo sem comprometer a rentabilidade?
De acordo com Rodrigo Garcia, diretor-executivo da Petina Soluções Digitais, a aversão ao custo de entrega é um dos fenômenos mais estudados no varejo online. “O consumidor brasileiro processa o custo do frete de forma diferente do preço do produto. Quando o frete é zero, mesmo que o valor do produto seja ligeiramente maior, o cérebro interpreta como um ganho absoluto, o que contribui para aumentar a taxa de conversão. Esse chamado “efeito zero” cria uma sensação de vantagem tão forte que muitas vezes anula a busca pelo menor preço total”, explica.
Pesquisas confirmam essa percepção. Um levantamento da Opinion Box em parceria com a Octadesk mostra que 67% dos consumidores brasileiros apontam o frete grátis como um dos principais fatores de decisão de compra. Outro estudo, da CT Trends, indica que 65% dos clientes desistem da compra diante de um frete elevado, enquanto 85% preferem lojas que oferecem entrega gratuita ou mais acessível. Já a Econsultancy aponta que o frete caro responde por até 55% dos abandonos de carrinho.
Inteligência de dados e sustentabilidade
A implementação do frete grátis, segundo o executivo, deve ser pontual, e não regra. A estratégia deve considerar segmento, ticket médio e perfil do consumidor. “Em categorias de alta recorrência e margem, como moda íntima, beleza e cuidados pessoais, o frete grátis costuma valer a pena. O custo se dilui no comportamento de recompra”, comenta.
Já em segmentos de maior valor e menor frequência, como eletrônicos, móveis e eletrodomésticos, a lógica é diferente. Nesses casos, faz sentido adotar frete grátis acima de determinado valor ou em campanhas sazonais. O segredo está na inteligência de dados: cruzar custo logístico, margem por produto e comportamento de compra para criar regras automáticas e rentáveis. “Negociações mais agressivas com marketplaces e operadores logísticos também são essenciais para viabilizar a estratégia”, afirma.
O valor emocional por trás do “grátis”
Garcia destaca ainda o componente simbólico do benefício. “Não se trata apenas de economizar alguns reais. O frete grátis é percebido como um presente, um gesto de generosidade e cuidado da marca. Esse fator emocional gera vínculo positivo que vai além da transação comercial”, explica.
Essa percepção, segundo ele, torna o frete gratuito um poderoso gerador de lealdade. “O consumidor se sente valorizado e recompensado. É um diferencial competitivo intangível, mas extremamente real. Muitas vezes, é justamente essa carga emocional que define a escolha final.”
Garcia reforça que a discussão deixou de ser sobre oferecer ou não, e passou a ser sobre a forma de implementação. “A questão hoje não é mais ‘se devemos oferecer’, mas ‘como, quando e para quem oferecer’. O consumidor busca conveniência, transparência e preço justo. As marcas que entenderem esse tripé estratégico certamente sairão na frente”, finaliza.