Por Marcel Nobre – professor da USP, pesquisador, palestrante e especialista em inovação, tecnologia e educação
A lógica da Black Friday mudou. O consumidor não aceita mais truques ou meias verdades: ele quer confiança, legitimidade e experiência personalizada. Colocar o cliente no centro não significa criar grandes projetos de transformação digital ou gastar milhões em tecnologia, significa entender de fato quem ele é, o que valoriza e como se relaciona com a marca. A diferença entre um bom e um grande empreendedor está em ir além da obrigação. Se na Black Friday uma empresa mostra que ouviu, personalizou e entregou valor real — seja em preço justo, clareza na comunicação ou experiência confiável —, ela não só vende mais, como conquista fidelidade. A Inteligência Artificial é o que torna isso possível em escala: antecipar necessidades, detectar fraudes em segundos e ajustar ofertas em tempo real. Mas, no fundo, o que está em jogo não é a IA, mas sim a capacidade de usar a tecnologia para provar, em cada detalhe, que o cliente é realmente o centro da estratégia.
Em 2025, a Black Friday deixará de ser um espetáculo de descontos para se tornar um teste de confiança e maturidade digital. Uma pesquisa recente da Abiacom mostra isso: o e-commerce nacional deve movimentar R$13,34 bilhões nesta edição, um crescimento de 14,7% sobre o ano passado, e ultrapassar 16 milhões de pedidos, com ticket médio acima de R$800. Mas o que sustenta esse avanço não é a guerra de preços: é a inteligência que conecta oferta, experiência e transparência em tempo real. Pesquisas da Conversion e do Mercado Livre mostram que 54,6% dos consumidores pretendem usar IA para comparar preços e encontrar as melhores oportunidades. É um sinal claro de que a tecnologia deixou de ser apenas uma aliada das empresas para se tornar também um instrumento de empoderamento do consumidor, que agora usa algoritmos para medir a honestidade das marcas.
Essa mudança de lógica já se reflete dentro das próprias empresas. As líderes do varejo digital já operam com base em três pilares: hiperpersonalização, para criar experiências únicas orientadas por IA; rentabilidade sustentável, para proteger margens mesmo no pico de demanda; e eficiência omnicanal, integrando loja física e digital de forma fluida e previsível. Não dá mais para oferecer tudo para todos. A IA permite entender o comportamento do cliente, ajustar preços conforme a demanda e prever entregas com precisão.
Essa inteligência já atua nas camadas mais críticas do e-commerce, desde a recomendação de produtos até a precificação dinâmica. Algoritmos cruzam estoque, histórico de compras e capacidade logística para sugerir ofertas sob medida, exibir o frete real e ajustar preços em segundos — num modelo semelhante ao das companhias aéreas. A personalização deixou de ser promessa e virou infraestrutura.
Reportagens recentes mostram como o uso estratégico da inteligência artificial vem se consolidando como um diferencial competitivo na Black Friday brasileira. Segundo a InfoMoney, a tecnologia tem sido aplicada em processos críticos do e-commerce, como detecção de anomalias, prevenção de fraudes e correção de erros de precificação, garantindo margens seguras e reforçando a reputação das marcas em um ambiente de alta volatilidade. Já a Carta Capital destacou que, na Black Friday de 2024, sistemas inteligentes processaram milhões de integrações e transações em tempo real, evidenciando o papel da automação e da IA como pilares da nova economia da confiança, em que cada segundo conta e cada falha pode comprometer resultados.
Esses exemplos mostram que a IA não é mais uma promessa futurista, mas uma ferramenta de sobrevivência num mercado em que o tempo de resposta define o valor da marca. A capacidade de ajustar preços, prever gargalos e corrigir falhas antes que afetem o cliente é o novo diferencial competitivo. Ainda assim, há um limite que a tecnologia sozinha não ultrapassa: a confiança. Segundo pesquisa da Locaweb, 86% dos consumidores brasileiros consideram a transparência sobre preços e condições o fator mais determinante na decisão de compra. Isso significa que, mesmo com algoritmos refinados e IA ajustando tudo em tempo real, o cliente só volta se acreditar na integridade da marca. A IA pode aprender padrões, mas não pode simular caráter.
A grande virada da Black Friday de 2025 é simbólica. A Inteligência Artificial deixou de ser o “bicho-papão” que ameaça empregos e passou a ser o elo de confiança entre marcas e consumidores. Ela não substitui o humano — amplifica a capacidade das empresas de entregar o que prometem. As companhias que compreenderem essa mudança sairão da Black Friday com algo mais valioso do que faturamento recorde: a fidelidade de um cliente que confia. Porque, no fim das contas, a IA é apenas o instrumento. O que realmente muda o jogo é a cultura de confiança, e as marcas que entenderem isso agora terão um ativo que nenhuma tecnologia substitui: a lealdade genuína do consumidor.
A Black Friday de 2025 será, portanto, o encontro entre dois tipos de inteligência: a artificial, das máquinas; e a emocional, do público, cada vez mais intolerante a promessas vazias.

