Um cliente fiel, que há anos compra no ecommerce da marca, entra em uma loja física. O vendedor o recebe com simpatia, mas sem acesso ao seu histórico. Sem contexto, oferece produtos que pouco têm relação com seu perfil. O cliente se frustra, sai sem comprar e a venda se perde. O problema não é o cliente, é o sistema.
Enquanto o consumidor já vive de forma integrada, o varejo ainda se comporta como se atendesse pessoas diferentes: uma no site, outra no app, outra na loja física. Por trás do discurso moderno, a realidade ainda é fragmentada e essa desconexão custa caro e se traduz em margens comprimidas, experiências inconsistentes e oportunidades de venda desperdiçadas.
Segundo a ABComm, o ecommerce brasileiro faturou R$204,3 bilhões em 2024 e deve chegar a R$234,9 bilhões em 2025. A expansão é inegável, mesmo com os canais ainda desconectados. Imagine o potencial de crescimento se todos esses pontos de contato realmente conversassem entre si. A integração total entre físico e digital não seria apenas uma tendência: seria uma revolução de margem, eficiência e receita.
Quando o sistema não conecta todos os pontos da jornada, o impacto no resultado é imediato. Num modelo fragmentado, o cliente pesquisa no site, encontra um preço, mas vê outro na loja. O produto que parecia disponível está esgotado, e o vendedor não sabe que ele já tentou comprar pelo app. A experiência quebra e a venda, quase sempre, se perde. Agora imagine esse cenário em uma operação realmente integrada: o cliente é reconhecido em qualquer canal, o preço é consistente, o estoque se atualiza em tempo real e o atendimento já começa com o histórico completo à disposição. O que antes era fricção vira fluidez. O que antes gerava desistência vira conversão.
Estudos da McKinsey e da Deloitte mostram que empresas que oferecem experiências verdadeiramente integradas conseguem aumentar em cerca de 20% a retenção de clientes e em até 30% a rentabilidade, em comparação às que ainda operam de forma fragmentada. Em um contexto de margens cada vez mais estreitas, essa diferença pode representar milhões de reais em EBITDA de um exercício.
O problema é que boa parte do mercado construiu o que chamo de “omnicanalidade de fachada”. Varejistas investem em múltiplos canais, mas esquecem de conectá-los. Sistemas legados, bases de dados descentralizadas e equipes que ainda trabalham de forma isolada impedem que as marcas enxerguem o cliente como um só. O resultado é uma sensação de modernidade sem entrega real de valor.
A virada acontece quando o negócio passa a operar com um único cérebro, capaz de reunir, interpretar e agir sobre dados em tempo real, sustentado por uma única fonte da verdade (“single source of truth“). É essa base unificada, estrategicamente alocada na arquitetura para alimentar rápido qualquer canal de venda, que permite decisões rápidas, personalizadas e consistentes, em vez de percepções fragmentadas.
E é a partir desses dados — centralizados, seguros e organizados — que a Inteligência Artificial vai se alavancar para redefinir as experiências de compra e interação com as marcas.
Uma análise conduzida pela VTEX em sua base de clientes na América Latina mostrou, na prática, o impacto da Inteligência Artificial sobre performance e eficiência no varejo. Em varejistas de eletrônicos, por exemplo, sistemas de busca por contexto com IA — isto é, mecanismos que entendem o significado e a intenção por trás da pergunta para entregar resultados mais relevantes, mesmo quando ele não usa o nome exato do produto — elevaram as taxas de conversão em até 17% e reduziram em mais de 50% as buscas sem resultado.
No setor de moda e esportes, assistentes automatizados resolveram 87% dos atendimentos sem intervenção humana, diminuindo em 20% o custo operacional e, em alguns casos, alcançando até 94% de satisfação do cliente. E entre marcas de beleza e bem-estar, recomendações inteligentes de produtos — sistemas que analisam o comportamento, preferências e histórico de compra do cliente para sugerir exatamente o que faz sentido para ele naquele momento — aumentaram em 6% a receita e em quase 10% o número de itens comprados por cliente.
Além disso, soluções de Ads baseadas em IA têm se tornado uma nova frente de geração de receita para o varejo: elas entregam anúncios mais precisos, convertem melhor na ponta e ainda devolvem dados valiosos para a indústria, fortalecendo todo o ecossistema. Esses são números que mostram como a IA deixou de ser um investimento em inovação para se tornar uma alavanca direta de crescimento, margem e eficiência para o varejo.
Mas essa transformação não acontece apenas pela adoção de novas ferramentas, ela exige uma mudança de mentalidade. Ser verdadeiramente omnichannel não é estar em todos os lugares, é ser o mesmo em todos eles. É integrar dados, equipes e processos em torno de uma visão única, que permita decisões ágeis e personalizadas em tempo real.
Personalização gera conexão e conexão gera conversão. Até aqui, personalização e escala eram estratégias antagônicas. Com dados centralizados, no lugar certo e capaz de gerar informação em tempo real, e com o apoio da AI, a personalização se torna escalável dentro do varejo. Chegou ao fim a era do trade-off entre atender bem, entender cada cliente como único e ser eficiente.
O varejo do futuro não será definido pelos canais que ocupa, mas pelo valor e pela consistência que entrega em todos eles. O cliente é um só. O seu varejo também precisa ser.

