Por Jasper Perru , head de Groth & Performance do ecossistema ANYTOOLS
A Black Friday deixou de ser uma corrida de 24 horas para se tornar um ciclo estratégico de pelo menos 60 dias. O varejo online brasileiro vive hoje um modelo em que outubro aquece, novembro se converte e dezembro se consolida, e quem continua planejando como se tudo se resumisse a um único pico está ficando para trás.
Uma análise do ANYMARKET sobre o mercado de marketplace confirma que, embora o crescimento da Black Friday permaneça relevante, sua dinâmica mudou de forma estrutural. Considerando as vendas de outubro e novembro, o GMV avançou 39,5% e o volume de pedidos cresceu 26,07% na comparação anual. A sexta-feira de Black Friday registrou alta de 44,93% em GMV em 2025, enquanto o período até a Cyber Monday acumulou crescimento de 43,97%.
No entanto, esses resultados vieram acompanhados de uma perda de concentração das vendas ao longo do mês. A participação da Black Friday e da Cyber Monday no total de vendas de novembro recuou de 24,7% em 2024 para 23,7% em 2025, evidenciando uma redistribuição da demanda para outros momentos do calendário. O 11/11 surge como um dos principais vetores dessa diluição, ao apresentar crescimento expressivo de 155,9% em 2025 frente à mesma data do ano anterior, consolidando-se como um novo pico relevante dentro do mês.
Esse crescimento não nasce do acaso: é resultado direto de um consumidor mais criterioso e consciente, de marketplaces mais competitivos e de sellers mais maduros, capazes de alinhar estoque, dados e operação para aproveitar uma janela comercial que, hoje, dura quase um trimestre. Em debates internos, com parceiros que trabalham ativamente no setor, não falamos mais em uma data isolada, mas em um trimestre estratégico. Isso exige integração real entre canais, ERP, logística e atendimento, com qualquer ruptura ou atraso tem impacto direto em reputação e visibilidade.
Os dados internos reforçam a tese: nesta última Black Friday, o ANYTOOLS participou de 10% de todo o e-commerce brasileiro. Um movimento desse porte só acontece quando sellers operam com qualidade, profundidade de estoque e inteligência comercial. A gestão preditiva e a preparação começam meses antes, com ajustes de infraestrutura, novos backlogs de funcionalidades, alinhamento entre atendimento e estratégia e aproximação direta com marketplaces. O resultado é uma operação capaz de sustentar picos sem incidentes e transformar dados em vantagem competitiva.
Outro fator determinante é o comportamento do consumidor. A venda diluída ao longo do mês e a disputa por atenção, impulsionada por afiliados, lives, cupons e ofertas relâmpago, tornam o cenário ainda mais competitivo. Os marketplaces, com tráfego massivo e disposição para investir, ampliaram seu protagonismo. Sellers preparados souberam usar isso a seu favor: garantiram visibilidade, aumentaram o catálogo, negociaram ações agressivas e aproveitaram campanhas patrocinadas pelos próprios marketplaces. E a tendência deve seguir em dezembro, já que as plataformas querem fidelizar a fatia de mercado conquistada em novembro.
Em paralelo, a automação desponta como o maior divisor de águas. A sincronização de estoque, a criação de kits inteligentes, a aplicação de regras comerciais específicas por canal e o controle rigoroso de pedidos evitam erros caros, não apenas em dinheiro, mas em reputação. O desconto puro virou armadilha. Sem estratégia, o seller vende, mas lucra menos.
O pós-venda também ganhou protagonismo. Com o aumento de compras impulsivas, cresce o volume de dúvidas, cancelamentos e devoluções. Identificar padrões por canal, produto ou transportadora permite respostas mais rápidas e eficientes. A IA acelera diagnósticos e libera equipes para resolver casos complexos. Ignorar o pós-venda significa perder margem, reputação e exposição futura.
Outro ponto crítico é a conciliação financeira. Em semanas repletas de regras especiais de comissão, rebates e cupons, qualquer divergência corrói a margem. Sellers que não conciliam por SKU, canal e período correm o risco de pagar comissões acima do acordado e comprometer o resultado da campanha.
No saldo final, a Black Friday deste ano pode ser destacada na maturidade dos sellers e na força de ecossistemas. As visitas realizadas a grandes operações durante a semana reforçaram parcerias, garantiram confiança e mostraram o impacto real das soluções do grupo na vida dos profissionais por trás de operações gigantes.
A visão que se impõe para 2025 é clara: o e-commerce entrou em uma era mais competitiva, orientada a dados, centrada em automação e baseada em previsibilidade. O desafio do seller deixa de ser “vender muito em novembro” e passa a ser “performar bem durante todo o trimestre estratégico”. O pós-Black Friday, e não a data em si, é o verdadeiro diferencial. Quem domina esse ciclo vende mais e vende melhor.

