Automatizar operações, processar dados, mapear padrões e perfis, realizar atendimentos e melhorar a experiência do cliente. Essas são apenas algumas das infinitas maneiras em que a Inteligência Artificial (IA) vem sendo utilizada pelo universo corporativo. Uma pesquisa, realizada pela McKinsey, mostrou que o interesse das organizações pelo uso da IA vem crescendo ano a ano. Em 2024, cerca de 72% das empresas em todo o mundo já utilizavam a tecnologia de alguma forma, um salto em relação aos 55% registrados no ano anterior.
Nesse cenário, em que a inteligência artificial se torna cada vez mais presente no dia a dia das organizações, um questionamento é inevitável: o que resta de exclusivamente humano no futuro do trabalho? Para o professor da UniSociesc, Fernando Luiz Freitas Filho, doutor em Engenharia e Gestão do Conhecimento e especialista em Educação, o segredo não está em competir com as máquinas, mas em ser “mais humano do que nunca”.
“A automação, os algoritmos e os robôs assumem tarefas antes realizadas por pessoas, mas há um conjunto de competências que permanecem insubstituíveis, e que serão, mais do que nunca, determinantes para quem quiser se manter relevante”, comenta o especialista. Ele defende que o profissional do futuro é aquele que alia a técnica à sensibilidade, alguém capaz de entender processos, mas também de compreender e inspirar pessoas.
O território humano inabalável
As máquinas e os algoritmos já provaram sua eficiência em tarefas repetitivas e, mais recentemente, em funções cognitivas como a geração de relatórios e conteúdos. No entanto, sua atuação é fundamentalmente reativa e baseada em dados existentes. A verdadeira criação ainda é domínio exclusivo da mente humana.
“A criatividade genuína, que concebe ideias realmente novas e não apenas recombinações do que já foi feito, é uma fronteira que a IA ainda não cruzou. Da mesma forma, a capacidade de colaboração profunda, de construir relações de confiança e de engajar equipes através da motivação e da inspiração são características humanas insubstituíveis”, pontua o professor.
Aprendizado contínuo, conexão e colaboração: o valor do humano
Um estudo realizado pela Dell Technologies em parceria com o Institute for the Future, estima que 85% dos empregos que existirão em 2030 ainda não foram criados. Diante desse dado, a capacidade de “aprender a aprender” – ou metacognição – se torna a âncora para a relevância profissional. “O foco deve migrar da acumulação estática de conhecimento para a agilidade em assimilar novos saberes e se adaptar a ferramentas emergentes, como a própria inteligência artificial generativa”, recomenda o professor.
Nesse contexto, a IA deve ser encarada não como uma rival, mas como uma aliada estratégica. “Utilizá-la para criar roteiros de estudo, explorar novos assuntos ou otimizar processos é um uso inteligente da tecnologia para liberar tempo e capacidade mental para as tarefas que demandam essencialmente humanidade”, comenta.
Paralelamente, em tempos de hiperconectividade digital, a conexão humana genuína se torna um ativo escasso. Para Fernando, o futuro do trabalho exigirá mais do que networking: pedirá colaboração real, troca de experiências e construção coletiva. “É fundamental criar laços que não sejam apenas de interesse comercial. Estar em grupos e associações para aprender, contribuir e cooperar é o que fortalece as relações e amplia a visão de mundo.”
Entre as competências que mais ganharão destaque, Fernando aponta duas: flexibilidade cognitiva e emocional. A primeira diz respeito à abertura para novas ideias, pontos de vista e conhecimentos. “É a capacidade de ouvir opiniões diferentes e buscar múltiplas fontes antes de formar sua própria conclusão.”
Já a flexibilidade emocional está ligada à empatia e à tolerância. “É saber conversar com quem pensa diferente sem hostilidade, compreender visões opostas e construir algo a partir do diálogo.”
Emoções e propósito: o lado humano da produtividade
Na visão do educador, a tecnologia deve ser usada para melhorar a qualidade de vida, e não apenas para aumentar a produtividade. “O que adianta termos um mundo automatizado, com robôs e IA fazendo tudo, se continuamos estressados, exaustos e sem propósito?”, questiona.
Ele cita os princípios da chamada “ciência da felicidade”, que incluem emoções positivas, engajamento, relacionamentos significativos, propósito e realizações. “Quando fazemos algo que gostamos, em um ambiente saudável, com colegas que se apoiam, o trabalho ganha sentido. Isso é impossível de programar em uma máquina”.
Mais do que eficiência, as empresas do futuro precisarão cultivar humanidade, criando espaços que valorizem o bem-estar e o equilíbrio. É o que diferencia um time basicamente produtivo de um time criativo e inovador.
O futuro é humano
A IA é uma ferramenta poderosa, mas ainda depende da direção humana para fazer sentido. Ela organiza dados, sugere caminhos, executa tarefas, mas quem define o propósito, quem decide o porquê, é sempre o ser humano.
Para o professor Fernando, o profissional do futuro será aquele que unir o melhor dos dois mundos: a precisão das máquinas e a sensibilidade das pessoas. “As máquinas foram feitas para facilitar a vida, não para substituí-la. O papel da tecnologia é nos ajudar a sermos mais produtivos e, principalmente, mais felizes. Em tempos de inteligência artificial, o diferencial será cada vez mais natural: a inteligência emocional”, conclui.

